segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Osho- Sannyas


— O que entendo por sannyas é uma disciplina espiritual através da qual uma pessoa se torna religiosa, mas isto não está acontecendo comigo. O que fazer?

Meus sannyas não é uma disciplina. Meu sannyas é liberdade; liberação de todo o controle— até mesmo do autocontrole. Um homem controlado é um homem morto. Não faz muita diferença se você é controlado pelos outros ou por si mesmo. Meu sannyas é espontaneidade, é viver cada momento sem nenhuma disciplina préfabricada, é viver com o desconhecido sem saber exactamente para onde você está indo, porque se você já sabe para onde está indo, está morto. A vida passa mecanicamente. E a vida deve ser um fluxo do conhecido para o desconhecido. É preciso morrer a cada momento em relação ao conhecido para que o desconhecido possa penetrar em você. E só o desconhecido libera. A disciplina jamais pode vir do desconhecido. A disciplina tem "que vir da mente. A mente é seu passado. Tudo o que você aprendeu, tudo aquilo que foi condicionado a ser, tudo o que experimentou, tudo o que pensou — isto é sua mente. E dessa mente vem um plano para o futuro. Esse plano para o futuro nada mais é que uma repetição do passado; não pode ser nada mais além disso. Talvez um pouco modificado aqui e ali, enfeitado aqui e ali, mas não há nele nenhuma revolução radical. Meu sannyas é uma revolução radical. Com o sannyas eu lhe dou liberdade. Dou-lhe coragem para viver sem nenhum plano, para viver sem mente, para viver sem passado. É claro que é perigoso, mas a vida é perigosa. Só quando você está morto não há perigo. Então você está a salvo — está a salvo na sua tumba. Antes disso jamais existe segurança. Se você quer estar seguro, a salvo e perfeitamente protegido, livre de todos os perigos, então não entre no sannyas, entre em sua tumba. Não respire, porque respirar é perigoso. Um dia, a respiração lhe trará a morte. Respirar é perigoso. A vida existe no perigo, pulsa no perigo. A vida existe no oceano da morte. Ela tem que ser perigosa; não pode ser salva, segura. Você não é uma pedra. Você é uma flor, é frágil — de manhã, ri com o sol; à noite, vai-se embora. Como a vida pode ser segura? Na sua fraqueza, na sua fragilidade, como é possível ainda conceber segurança? Não, não há segurança, não pode haver. E não se pode viver da filosofia que as companhias de seguro vão propagando. É preciso conviver com o perigo, de mãos dadas com a morte. Extraordinárias dimensões abrem-se então à sua frente. Deus é revelado. Deus é muito perigoso. Não existe nenhuma palavra mais perigosa do que Deus. Deus significa viver uma vida espontânea, uma vida natural. Não tente corromper o seu futuro. Deixe-o ser. Não tente corrompê-lo, não tente controlá-lo. Não imponha a ele um molde, uma forma e um padrão. É claro que se você viver da maneira como ensino, muitas coisas desaparecerão da sua vida. A primeira delas será a segurança — e ela é uma coisa falsa. Só o falso desaparece com o sannyas, o real não. O real começa a aparecer. A segurança desaparecerá. O casamento desaparecerá. O amor permanecerá; o amor é real. Deixe-me ser mais claro: o amor pode existir com o sannyas, mas o casamento não, pois o casamento é um esforço no sentido de impor um padrão ao amor, impor uma disciplina ao amor, impor uma legalidade, uma forma social. Mas o que você está fazendo? Como pode controlar aquilo que ainda não aconteceu? Você pode amar uma mulher ou um homem, e sentir nesse momento que amará para sempre. Mas isso é um sentimento apenas desse momento. Como você pode prometer? Um homem autêntico jamais promete. Como se pode prometer algo para o futuro? Como é possível dizer que se será realmente capaz de amar também amanhã? Se o amor desaparecer, o que você fará? E ele aparece por conta própria, você não pode fazê-lo acontecer; então quando ele desaparecer, o que você fará? O amor vai e vem; aparece e desaparece. Ele não está sob o seu poder; é muito maior do que você. Assim, quando você diz: "Eu o amarei também amanhã", o que está fazendo? Se o amor desaparecer, você fingirá, representará. É isso o que acontece num casamento. E duas pessoas, vivendo num relacionamento morto, discutem, lutam, aborrecem uma à outra, tentando dominar, manipular, explorar e destruir. O casamento é uma coisa feia. O amor é tremendamente belo. Meu sannyas é como o amor, O antigo sannyas era mais como o casamento. Meu sannyas é simplesmente uma coragem de encarar tudo o que está acontecendo, sem qualquer ensaio. Como você pode preparar? O amanhã não é absolutamente conhecido. Seja o que for que você prepare, será um empecilho; tomar-se-á uma tela diante de seus olhos e você não conseguirá ver o que é. Toda preparação é perigosa. Fique despreparado. E então você ficará excitado, cada momento será uma alegria e um deslumbramento, cada momento trará algo novo, algo que nunca lhe aconteceu, e você nunca ficará entediado. A vida do casamento, a vida de toda disciplina é uma vida de tédio — é monótona. Monogamia é monotonia. Você tem que repetir a mesma coisa. Não está livre para explorar novos caminhos do ser. Não está livre para ver coisas novas. Não está livre para experimentar novas belezas, novas verdades. Se você é disciplinado, o que isso significa? Significa simplesmente que agora você tem um ponto de vista determinado, que seus olhos não estão mais abertos. Você é um cristão e tem uma disciplina. É um hindu e tem uma disciplina — um dogma, e seus olhos estão completamente lotados por esse dogma. Então você não pode ver o que é. Eu gostaria que você fosse totalmente descontrolado. Gostaria que fosse um caos absoluto, sem nenhuma ordem, qualquer que fosse ela. E, por favor, não me entenda mal. Existe toda a possibilidade de equívoco, pois quando digo algo tenho que usar palavras e as palavras estão corrompidas demais — corrompidas por você, corrompidas pelo uso, pelos séculos. Quando digo "caos", você sente medo. Mas você não conhece a beleza do caos nem conhece a ordem espontânea de um caos. Não conhece a ordem que vem da liberdade. Sem ser imposta pela sua mente ou pelo seu passado, mas apenas por você estar atento, alerta, livre, responsivo, uma ordem surge. Eu não a chamo de ordem, porque está mudando a todo momento. Não a chamo de disciplina, porque não tem nada a ver com você. Nesse caos você não existe mais, O ego desapareceu. Quem está disciplinando? O ego. O ego diz: torne-se um homem melhor, dê uma melhorada em si mesmo; você é um pecador, seja um santo; você é violento, seja não-violento; você sente raiva, seja mais amoroso. Mas quem está fazendo isso e quem é esse que almeja melhorar? O ego quer um pouco mais de decoração, quer ser mais respeitável, quer se tornar mais seguro, quer se sentir mais enraizado no mundo, quer sentir-se mais sólido, quer tornar-se alguém em particular, quer ser alguém especial. Não, meu sannyas não lhe dará nada desse tipo. Eu não lido com coisas mortas, não é esse o meu negócio. Todo o meu esforço aqui é para lhe dar um sabor de liberdade. Uma vez conhecido o sabor, você nunca mais aceitará qualquer outra coisa. Se for uma questão de ajustar-se a qualquer coisa, você está enganado. Meu sannyas é uma busca, não um ajustamento. No meu sannyas você pode repousar, mas pela manhã terá que partir. É um fluxo constante, é como um rio — a menos que se alcance o oceano. Mas, naturalmente, pelo fluir do rio aparece o oceano. Não há planos quanto ao oceano; o rio não sabe de nada. Para um rio não existem mapas. Ele não sabe onde está o oceano. O rio não tem nenhuma disciplina. As vezes vai para o sul, outras vezes começa a se mover para o norte; às vezes vai numa direcção, outras vezes vai noutra. Você já viu o ziguezague de um rio? Não é um caminho recto. Ele não é económico, não é matemático. Não é absolutamente o caminho mais curto — é muito sinuoso, apenas vai, sem saber para onde está indo; vai somente porque tem energia para ir. E um dia o rio alcança. Se ele planejasse, então encontraria a rota mais curta, mover-se-ia numa linha reta e nunca se desviaria; seria então muito consistente. Mas nesse caso não seria um rio. Talvez fosse um canal, um canal feito pelo homem, mas não um rio. Não teria nenhuma liberdade. Não quero que você seja um canal. Os canais são feios. Quero que você seja um rio. E a vida é um caminho montanhoso. Mova-se em liberdade, em total liberdade, e lembre-se a cada momento de abandonar o passado. Ele se acumula como poeira. Você experimenta alguma coisa a cada momento e vai acumulando. Não acumule. Ponha um fim a tudo o que está relacionado ao passado; que tudo o que é passado vá morrendo, para que você seja totalmente livre, pulsante, borbulhante, fluente, e, venha o que vier, encare com atenção. Você deve ter uma ideia errada sobre o meu sannyas.
Diz: O que entendo por sannyas é uma disciplina espiritual. .. Nesse caso, o significado que você dá é diferente do meu. Não, ele não tem nada a ver com disciplina — e não tem nada a ver com espiritualidade.

Quando Bodhidharma chegou à China, o Imperador o recebeu e lhe fez uma pergunta:
"Tenho realizado muitos actos meritórios. Construi muitos mosteiros budistas, milhares de monges budistas são alimentados com meu tesouro, milhões de chineses converteram-se ao budismo, milhares de templos foram erguidos a Buda. Qual será o meu mérito por tudo isso?" Bodhidharma ficou furioso e olhou nos olhos do Imperador, dizendo: "Majestade, não há nenhum mérito nisso".
O Imperador ficou muito chocado, pois antes muitos budistas tinham vindo — monges e missionários — e haviam dito: "Será esta a sua recompensa: você alcançará o sétimo paraíso. Realize mais acções virtuosas, faça mais doações, construa mais mosteiros, mais templos, estátuas de Buda, converta todo o país ao budismo. Sua recompensa será grande, Majestade". E agora vem esse Bodhidharma dizendo que não há nenhuma recompensa? Mas o Imperador era um homem muito educado. Mudou de assunto; abandonou o tema diante de muitas pessoas. E aquele homem parecia perigoso. Disse então: «Diga-me algo sobre a sagrada verdade de Buda». E Bodhidharma disse: «Nada pode ser dito sobre ela, porque é incomensurável, e, lembre-se, não há nada de sagrado nela. Sagrado e não-sagrado fazem parte da mente dual. Não há nada de sagrado, nada de profano; ela simplesmente é». Isto gora era demais. O Imperador sentiu-se muito ofendido. Ele negava até a verdade de Buda dizendo que não havia nada de sagrado nela. Começou a sentir raiva. Esqueceu por um momento toda a sua cortesia e disse: "Quem, então, é esse homem que está diante de mim?" E Bodhidharma ajoelhou-se, dizendo: "Eu não sei, Majestade".

Meu sannyas não é espiritual, porque eu não divido o mundo em material e espiritual. Não é nada sagrado, pois não divido o mundo em sagrado e profano. Tornando-se saniasin você não se torna um santo, porque não divido as pessoas em santos e pecadores. Pessoas são pessoas. Todas são belas — santos, pecadores, qualquer um. Na verdade, se no mundo existissem apenas santos e nenhum pecador, não seria um lugar que valesse a pena viver. Pense num mundo em que só houvessem santos. É possível imaginar um mundo pior que esse? Não, não teria muito valor. O pecador e o santo são como a unha e a pele, estão juntos, são um só a luz e a escuridão. Morte e vida estão se encontrando a todo momento. Portanto, eu não o chamo de espiritual, pois não tenho nenhuma condenação a fazer. Na própria palavra 'espiritual' você já negou alguma coisa, condenou alguma coisa, julgou; você já declarou: "O material está errado e eu quero o espiritual". Não pode ver o simples facto de que você existe no corpo como o corpo? Alguma vez já viu uma alma sem um corpo, desencarnada? Ou viu algum corpo sem uma alma? A bifurcação é estúpida. A alma nada mais é que o dinamismo do seu corpo, e o corpo nada mais é que a materialização da sua alma. O corpo é a sua alma visível, e a alma é o seu corpo invisível. E eu gostaria que você fosse tanto materialista quando espiritualista. Eu não faço a divisão. Não quero criar nenhuma cisão em você. Você já é dividido. As suas chamadas religiões já causaram muitos danos a você. Elas criaram um mundo esquizofrénico no qual todos são divididos. É claro que então há tensões, ansiedades, angústias, pois você se tornou dois. Apenas por se dizer um ser espiritual, você está condenando o seu corpo e criando uma fenda entre o corpo e a alma, entre Deus e o mundo.

                                                                         'Osho- Extâse a Linguagem Esquecida'





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