quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Osho- Extâse


O êxtase é uma linguagem que o homem esqueceu completamente. Foi forçado a esquecê-la; foi compelido a esquecê-la. A sociedade é contra, a civilização é contra. A sociedade fez um enorme investimento na miséria. Depende da miséria, alimenta-se da miséria; sobrevive da miséria. A sociedade não é para os seres humanos. A sociedade está usando os seres humanos como um meio para ela mesma. A sociedade tornou-se mais importante que a humanidade. A cultura, a civilização, a igreja tornaram-se mais importantes. Elas destinavam-se ao homem, mas agora não são mais para ele. Elas inverteram quase todo o processo; agora, o homem existe para elas. Toda criança nasce em êxtase. O êxtase é natural. Não é alguma coisa que acontece somente aos grandes sábios. É algo que todos trazem consigo para o mundo; todos vêm com ele. É o mais profundo centro da vida. Faz parte do estar vivo. A vida é êxtase. Toda criança o traz para o mundo, mas então a sociedade salta sobre a criança, começa a destruir a possibilidade de êxtase, começa a tornar a criança miserável, começa a condicionar a criança. A sociedade é neurótica e não pode permitir que pessoas em êxtase estejam aqui. São pessoas perigosas para ela. Tente compreender o mecanismo; então as coisas serão mais fáceis. Você não pode controlar um homem em êxtase; é impossível. Você só pode controlar um homem miserável. Um homem extático fatalmente será livre; êxtase é liberdade. Ele não pode ser reduzido a um escravo. Você não pode destruir esse homem tão facilmente; não pode persuadi-lo a viver numa prisão. Ele quer dançar sob as estrelas, quer caminhar no vento e quer falar com o sol e a lua. Precisa do vasto, do infinito, da imensidão, da enormidade. Não pode ser seduzido a viver numa cela escura. Você não pode fazer dele um escravo. Ele viverá sua própria vida e fará suas coisas. Isto é muito difícil para a sociedade. Se existirem muitas pessoas em êxtase, a sociedade sentirá que está se desintegrando, que sua estrutura não aguentará mais. Essas pessoas em êxtase serão rebeldes. Lembre-se, eu não chamo uma pessoa extática de 'revolucionária'; chamo-a de 'rebelde'. Um revolucionário é alguém que quer mudar a sociedade, mas quer substituí-la por outra. O rebelde é aquele que quer viver como um indivíduo e gostaria que não existisse nenhuma estrutura social rígida no mundo. Um rebelde não quer substituir esta sociedade por outra — porque todas as sociedades são iguais. A capitalista, a comunista, a fascista e a socialista são primas irmãs; não faz muita diferença. Sociedade é sociedade. Todas as igrejas são iguais — a hindu, a cristã e a muçulmana. Quando uma estrutura se torna poderosa, não quer ninguém em êxtase, pois o êxtase é contra a estrutura. Ouça e medite sobre isto: o êxtase é contra a estrutura. O êxtase é rebelde. Não é revolucionário. Um revolucionário é um homem político; um rebelde é um homem religioso. Um revolucionário quer outra estrutura, a que ele deseja, a que é a sua utopia, mas a estrutura é sempre igual. Ele quer estar no poder. Quer ser o opressor e hão o oprimido; quer ser o explorador e não o explorado; quer legislar e não ser legislado. O rebelde não quer leis e nem quer legislar. O rebelde é aquele que não quer regras no mundo. É anárquico. Um rebelde é aquele que confia na natureza, não nas estruturas criadas pelo homem, que confia que se a natureza agir por si mesma, tudo será belo. E é! Um universo tão vasto segue sem nenhum governo. Os animais, os pássaros, as plantas, tudo continua sem nenhum governo. Por que o homem precisa de governos? Algo deve estar errado. Por que o homem é tão neurótico que não pode viver sem legisladores? Há agora um círculo vicioso. O homem pode viver sem legisladores, mas nunca lhe foi dada nenhuma oportunidade os legisladores não lhes darão nenhuma oportunidade. Quando você souber que pode viver sem eles, quem vai querê-los aqui? Quem os suportará? Neste momento você está apoiando os seus próprios inimigos. Está votando em seus próprios inimigos. Dois inimigos estão numa disputa presidencial e você escolhe. Ambos são iguais. É como se você tivesse liberdade para escolher a prisão, em que prisão quer entrar. E vota contente — prefiro a prisão A ou a B; acredito na prisão Republicana ou na Democrática. Mas ambas são prisões. E uma vez que você apoia uma prisão, esta fez seu próprio investimento. Então, não permitirá que você tenha um sabor de liberdade.  Portanto, desde a infância não se permite que a criança experimente a liberdade, porque quando ela souber o que é liberdade, não fará concessões, não se comprometerá — não estará pronta para viver numa cela escura. Prefere morrer, mas não permitirá que ninguém a reduza a um escravo. Ela será afirmativa. É claro que não, estará interessada em ter poder sobre as outras pessoas. Esta é uma tendência neurótica: interessar-se demais em ter poder sobre os outros. Mostra simplesmente que no fundo você não tem poder e teme que se não se tornar poderoso, outros se apoderarão de você. Maquiavel diz que a melhor defesa é o ataque. A melhor maneira de se proteger é atacarantes. Estes chamados políticos — tanto no Ocidente quanto no Oriente — são todos no fundo, pessoas fracas que sofrem de inferioridade; temem que se não se tornarem politicamente poderosos, alguém irá explorá-los, então por que não explorar em vez de ser explorado? O explorado e o explorador estão ambos no mesmo barco — e ambos estão ajudando o barco, protegendo o barco. Uma vez que a criança conhece o sabor da liberdade, nunca mais fará parte de nenhuma sociedade, de nenhuma igreja, de nenhum clube, de nenhum partido político. Permanecerá um indivíduo, permanecerá livre e criará pulsações de liberdade ao seu redor. O seu ser tornar-se-á uma
porta para a liberdade. A criança não tem permissão para experimentar a liberdade. Se ela pergunta à mãe: "Posso sair? O sol está bonito, o ar está fresco e eu gostaria de correr na calçada", imediatamente - obsessivamente, compulsivamente — a mãe diz "Não!" A criança não pediu muito. Ela só queria sair numa manhã ensolarada de ar refrescante, queria desfrutar dos raios de sol, do ar e da companhia das árvores — não pediu nada! — mas compulsivamente, a partir de uma profunda compulsão, a mãe diz não. É muito difícil ouvir uma mãe dizer sim, é muito difícil ouvir um pai dizer sim. Mesmo que eles digam sim, dizem com muita relutância. Mesmo que digam sim, fazem com que a criança se sinta culpada, fazem com que ela sinta que os está forçando, que está fazendo alguma coisa errada. Sempre que a criança se sente feliz fazendo qualquer coisa, uma pessoa ou outra fatalmente vem interrompê-la — "Não faça isso!" Aos poucos a criança compreende: "Tudo o que me faz feliz está errado". E é claro que ela nunca se sente feliz fazendo o que os outros querem, porque não é uma necessidade espontânea dela. Então fica sabendo que ser miserável está certo, ser feliz está errado. Isto se torna uma associação profunda. Se ela quer abrir um relógio e olhar dentro dele, a família toda cai em cima — "Pare! Você destruirá o relógio. Isso não é bom". E ela só estava querendo olhar dentro do relógio; era uma curiosidade científica. Ela queria ver o que faz tique-taque. Está perfeitamente certo. E o relógio não é tão valioso quanto a sua curiosidade, quanto a sua mente inquisidora. O relógio não vale nada — mesmo que quebre, nada será destruído — mas quando a mente inquisidora é destruída, muito se destrói; ela nunca mais buscará pela verdade. Ou então, a noite está bela, o céu cheio de estrelas e a criança quer ir sentar-se fora de casa, mas é hora de dormir. Ela não está sentindo sono; está acordada, acordada demais. A criança não consegue entender por que de manhã, quando está com sono, todos dizem: "Levante-se!". Quando está gostando, quando é tão bom estar na cama, quando ela quer virar de lado e dormir mais um pouco, todos estão contra — "Levante-se! É hora de levantar". Agora está completamente acordada e quer desfrutar das estrelas. É um momento poético, muito romântico. Ela se sente excitada. Como pode dormir com tanta excitação? Quer dançar, cantar e eles a estão forçando a ir dormir — "São nove horas. É hora de dormir". Ela estava tão feliz acordada mas é forçada a dormir. Quando estava brincando foi forçada a comer na mesa. Não tinha fome. Quando está com fome, a mãe diz: "Agora não é hora". Desta maneira vamos destruindo toda a possibilidade de êxtase, toda a possibilidade de estar feliz, alegre e encantado. Sempre que a criança se sente espontaneamente feliz com alguma coisa, parece que está errado, e sempre que não se sente, parece que está certo. Na escola, de repente um pássaro começa a cantar fora da sala de aula e a criança presta atenção nele, é claro — não no professor de matemática que está parado na frente com seu feio giz na mão. Mas o professor é mais poderoso, politicamente mais poderoso que o pássaro. Certamente o pássaro não tem poder, mas tem beleza. O pássaro atrai a criança sem martelar sua cabeça: "Preste atenção! Concentre-se em mim!" Não, simplesmente, espontaneamente, naturalmente, a consciência da criança começa a fluir pela janela. Vai até o pássaro. O seu coração está lá, mas ela tem que olhar para o quadro-negro. Não há nada para olhar, mas ela tem que fingir. A felicidade está errada. Sempre que sente felicidade, a criança começa a sentir medo de que algo esteja errado. Se a criança está brincando com o seu próprio corpo, está errado. Se ela brinca com os seus órgãos sexuais, está errado. E este é um dos maiores momentos de êxtase na vida da criança. Ela gosta de seu corpo; é excitante. Mas toda a excitação tem que ser interrompida, toda a alegria destruída. É neurótico, mas a sociedade é neurótica. O mesmo foi feito aos pais pelos pais deles; e eles estão fazendo a mesma coisa para seus filhos. Desta maneira uma geração vai destruindo a outra. Assim, transferimos as nossas neuroses de uma geração para outra. A Terra toda se tornou um hospício. Ninguém parece saber o que é o êxtase. Ele foi perdido. Foram criadas barreiras e mais barreiras. Observo aqui diariamente que quando as pessoas começam a meditar, a sentir a ascensão da energia e a se sentirem felizes, elas imediatamente me procuram e dizem: "Uma coisa muito estranha está acontecendo. Estou me sentindo feliz e ao mesmo tempo me sentindo culpada, sem razão nenhuma". Culpa? Elas não entendem. Por que se sentem culpadas? Elas sabem que não há motivo — que não fizeram nada. De onde vem a culpa? Vem de um profundo condicionamento: a alegria está errada. Está certo sentir-se triste, mas não é permitido estar feliz. Certa vez, numa cidade em que eu vivia, o comissário de polícia era meu amigo; éramos
colegas de universidade. Ele costumava me procurar para dizer: "Sinto-me tão miserável. Ajude-me a sair disso". Eu respondia: "Você fala em sair disso, mas não sinto que você queira realmente. Em primeiro lugar, porque escolheu trabalhar nesse departamento de polícia? Você deve sentir-se miserável e quer que os outros também se sintam". Um dia pedi a três discípulos meus para que saíssem pela cidade, dançassem em lugares diferentes e se sentissem felizes. Eles perguntaram: "Para quê?" Eu respondi: "Apenas vão". Dentro de uma hora, é claro, eles foram presos pela polícia. Eu chamei o comissário e disse-lhe: "Por que você prendeu a minha gente?" Ele respondeu: "Eles pareciam loucos". Eu continuei: "Fizeram alguma coisa errada?" "Não, nada", disse ele. "Na verdade, não fizeram nada errado". "E por que os prendeu?", perguntei. Ele disse: "Eles estavam dançando na rua E estavam rindo". "Mas se não fizeram nada que fosse prejudicial aos outros, por que interferiu? Por que você teve que entrar no meio? Eles não atacaram ninguém, não invadiram o território de ninguém. Estavam apenas dançando, rindo, são pessoas inocentes." Ele disse: "Você está certo, mas é perigoso". "Por que é perigoso? Ser feliz é perigoso? Extasiar-se é perigoso?" Ele entendeu e imediatamente os soltou. Veio correndo para mim e disse: "Você deve estar certo. Eu não me permito ser feliz — e não posso permitir que ninguém mais o seja".  São esses os seus políticos, os seus comissários de polícia, os seus magistrados, os seus juizes, os seus líderes, os seus chamados santos, os seus padres, os seus papas — são essas pessoas. Todos eles investiram muito na sua miséria. Dependem da sua miséria. Se você é miserável eles se sentem felizes. Só uma pessoa miserável vai ao templo rezar. Uma pessoa feliz vai ao templo? Para quê? Uma pessoa feliz está feliz porque sente Deus em toda parte! Isto é que é felicidade. Ela está tão extasiadamente apaixonada pela existência que para onde quer que olhe, encontra Deus. O seu templo está em toda parte. E seja onde for que ela se ajoelhe, encontra os pés de Deus, nada mais. O seu respeito, a sua reverência, não precisam ser confinados de modo que ela tenha de ir a um templo hindu ou a uma igreja cristã. Isto é estupidez, não faz sentido. Somente as pessoas miseráveis, que não podem sentir Deus, não podem vê-Lo numa flor em botão, num pássaro cantando, num arco-íris psicadélico, numa nuvem flutuante, nos rios e nos oceanos, não podem ver Deus nos belos olhos de uma criança, vão à igreja, à mesquita, ao templo, vão aos padres, e perguntam: "Onde está Deus? por favor, mostrem-nos". Só as pessoas miseráveis estão disponíveis para as religiões. Sim, Bertrand Russel estava quase certo quando disse que se algum dia o mundo se tornasse feliz, a religião desapareceria. Eu disse quase certo, noventa e nove por cento certo. Não posso dizer cem por cento, porque conheço um outro tipo de religião da qual Bertrand Russel não tinha consciência. Sim, essas religiões desaparecerão — ele está certo em relação a elas: a hindu, a cristã, a muçulmana, a jainista, a budista, estas desaparecerão — desaparecerão com certeza. Se o mundo se tornar feliz, elas fatalmente desaparecerão, pois quem vai se importar? Mas ele está apenas noventa e nove por cento certo; um por cento errado. E esse um por cento e mais importante do que os noventa e nove por cento, porque um outro tipo de religião, a religião real, a religião do êxtase, a religião que não tem nome, não tem código, não tem Bíblia, nem Alcorão, nem Vedas, a religião que hão escrituras, não tem adjectivos; apenas uma religião de dança, uma religião de amor, uma religião de respeito, uma religião de bênção, a religião pura surgirá no mundo quando as pessoas forem felizes. Na verdade, essas religiões que existem não são religiões. São apenas sedativos, são tranquilizantes. Marx também está certo — é claro que só noventa e nove por cento — dizendo que a religião é o ópio das massas. Ele está certo. Essas religiões o ajudam a tolerar a miséria. Elas o ajudam, o consolam, dão-lhe a esperança de que: "Sim, hoje sou miserável; mas amanhã serei feliz". E esse amanhã não chega nunca. Dizem: "Nesta vida você é miserável, mas na vida seguinte. ..Seja bom, seja moral, siga as regras da sociedade — seja um escravo, seja obediente — e na próxima vida você será feliz". E ninguém sabe sobre a próxima vida. Ninguém jamais vem para dizer alguma coisa sobre ela. Ou se essas religiões não crêem numa próxima vida, dizem: "Quando você for para outro lado, para o céu, terá a recompensa". Mas obedeça aos padres e aos políticos. Há uma conspiração entre os padres e os políticos. São dois lados de uma mesma moeda. Eles se ajudam mutuamente. E todos têm interesse em que você permaneça miserável — assim os padres podem ter uma congregação e podem explorá-lo; e os políticos podem forçá-lo a ir à guerra em nome da nação, em nome do estado, em nome disto ou daquilo — tudo um absurdo, mas podem mandá-lo para a guerra. Somente as pessoas miseráveis podem ser alistadas para a guerra; só as pessoas profundamente miseráveis estão prontas para lutar, estão prontas para matar ou serem mortas. São tão miseráveis que para elas a morte parece ser melhor do que a vida.

                                                                    'Osho- Extâse a Linguagem Esquecida'


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